Vasco Palmeirim: "A televisão não é a minha profissão. Isto não é a minha vida"

Apesar de ter sido visto em <em>The Voice Portugal </em>e <em>The Voice Kids</em> por um milhão de telespectadores, o "betíssimo" sportinguista ferrenho, que recentemente aderiu ao golfe, continua a afirmar que a sua prioridade é a rádio. Palmeirim regressa amanhã à RTP1, com a nova temporada de <em>Sabe ou Não Sabe</em>.
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Está há dois anos, ininterruptamente, no ar. O que é que isso significa para si?

Significa que estou há muito tempo a dormir pouco [risos]. Mas também significa que, felizmente, o trabalho é muito, rádio e televisão, e a exposição também. Tenho a sorte de fazer aquilo de que gosto e a primeira ilação a tirar é que, se estou há tanto tempo no ar é porque a coisa está a correr bem e as pessoas gostam do trabalho que estou a fazer. Agora, também tenho de pensar. São dois anos a entrar, todos os sábados, em casa das pessoas, e tenho de me resguardar um bocadinho. É a chamada gestão de carreira. É o esforço que tenho com as músicas na Rádio Comercial. As pessoas gostam muito mas não posso fazê-las todos os dias. Faço de vez em quando para não cansar.

Em relação à Rádio Comercial, sente que as pessoas lhe cobram, sobretudo depois de ter começado a fazer televisão?

É isso que eu não quero que aconteça e que, até agora, não aconteceu. Até porque eu tenho plena consciência de que a rádio é o meu trabalho. É a minha profissão. Aquilo que eu faço na vida é ser animador de rádio. O que vem por acréscimo, e que é bem vindo, é a televisão. A televisão não é a minha profissão. Isto não é a minha vida. Obviamente que o faço hoje em dia - e gosto muito de o fazer - mas tenho de ter consciência de que, apesar de ter todo o carinho pelas pessoas que me veem na televisão e quegostam, não esqueço o meu primeiro amor, a rádio. Tenho a consciência de que tenho de fazer o máximo para que ninguém, especialmente eu, olhe para o que faço na rádio e pense: "Eh pá, aqui deleixei-me."

2015, apesar da estreia da quarta temporada de Sabe ou Não Sabe, vai ser um ano de maior resguardo ou tem algum grande projeto televisivo para os próximos seis meses?

Até agora, o que sei é Sabe ou Não Sabe. Mas quero ter esse trabalho de planificação. E também quero descansar um bocadinho. É muito tempo seguido de trabalhos não só de exposição, de grandes formatos como o The Voice Portugal, mas também de grande esforço físico. O Sabe ou Não Sabe é um programa que dá muito gozo fazer, que é a minha cara mas sai das entranhas. A mim e a toda a gente que o faz. Andamos de um lado para o outro em muito pouco tempo. Muitas viagens de carro, muitos quilómetros percorridos.

Quando, em 2013, participou como jurado na primeira edição de Feitos ao Bife esperava, um ano e meio depois, estar a apresentar um programa visto por um milhão de espectadores?

Nunca na vida! Aliás, quando fui convidado para ser jurado, pensei que ia ser uma experiência e que depois voltaria para a minha radiozinha. Durante o Feitos ao Bife, tocou o telefone para fazer o Sabe ou Não Sabe. Vi o formato espanhol e disse "isto é maravilhoso, vamos experimentar!". Nunca na vida pensei que, depois de Feitos ao Bife, houvesse o Sabe ou Não Sabe e, depois, o The Voice.

Quando começou a fazer televisão, no Canal Q, em 2010, não pensou que, um dia, podia estar a apresentar um grande formato?

Nunca pensei, porque as minhas características em televisão - achava eu - nunca se encaixariam num grande formato, uma coisa mais tradicional, com uma Catarina Furtado ou uma Bárbara Guimarães. Só há bem pouco tempo tivemos casos como o João Manzarra, um tipo com características mais parecidas com as minhas, a apresentar grandes formatos. O Manzarra fá-lo muitíssimo bem mas eu nunca pensei que um tipo com as minhas características pudesse fazê-lo.

Porque é que diz que Manzarra é um tipo com as suas características? Ele começou na televisão.

Em termos de humor, em termos da desconstrução da coisa. Ele não tem medo do nonsense. Pelo contrário. Se ele vê esse caminho, aproveita-o. Às vezes estou a ver o Factor X e penso "eu agora faria isto". E ele faz. Somos um bocadinho parecidos. Não tem que ver com o facto de ele ter ou não nascido na televisão.

Ou seja: o Vasco achou que seria sempre um apresentador de nicho e nunca tão mainstream como um programa como o The Voice?

Pode dizer-se que sim. Mas, depois, vejo o que acontece lá fora, como com o Nick Cannon [apresentador do talent showAmerica"s Got Talent], sorrio e percebo o que ele está a fazer. E percebe-se que, hoje, o formato de apresentação está aberto a uma falta de regras. Hoje é uma coisa mais aberta e é isso que eu faço também. Quando me dizem "queremos que faças isso", o que eu digo é "mas vocês já sabem que eu...". "É o que nós queremos, que sejas tu próprio." Portanto, hoje em dia, quando apresento as coisas, é um bocadinho à minha maneira.

Já lhe dão liberdade para isso?

Sempre deram e, se eu for demasiado "direitinho", as pessoas perguntam-me "o que é que se passa contigo?". Aquilo que as pessoas esperam é que eu seja o que sempre fui.

Quando começou o The Voice Portugal teve esse dilema? "Ok, agora estou a apresentar um grande formato na RTP, tenho de me conter mais"?

Nunca me passou pela cabeça porque o que me disseram foi: "Pensámos em ti para apresentar o The Voice mas queremos que sejas tu próprio." E eu agradeço porque, de outra forma, nem consigo trabalhar.

"A parceria com a Catarina [Furtado] é para repetir"

Há um crescendo, em termos de audiências, dos formatos que apresentou [Feitos ao Bife - Verão, teve 383 mil telespectadores de audiência média. A primeira edição de Sabe ou Não Sabe fez 604 mil, a segunda 679 mil. The Voice Portugal teve 914 mil espectadores e The Voice Kids 972 mil]. Que percentagem se deve a si?

Eh pá, não me faça essa pergunta! Não faço ideia! Pelo que as pessoas dizem, dá para perceber que há um carinho por mim. As pessoas metem-se comigo, sem vergonha e sem tabus. Vou dar-lhe um exemplo: no fim de semana passado estávamos em Viana do Castelo, a gravar o Sabe ou Não Sabe, e uma senhora chegou ao pé de mim de lágrimas nos olhos. E dizia-me: "Vasco, tenho de lhe agradecer porque você foi a única pessoa que me fez rir dois dias depois do falecimento da minha mãe." Eu, aí, percebo que o meu trabalho chega, de facto, às pessoas. Em resposta à sua pergunta, eu também tenho noção de que os programas, em si, são fortes. O Feitos ao Bife é um programa pelo qual tenho grande carinho. Era um formato totalmente novo e que as pessoas, se calhar, não perceberam muito bem. Teve um relativo sucesso. O Sabe também é um formato totalmente novo que, ao início, as pessoas também não entendiam muito bem. E, à medida que foram conhecendo o programa, o sucesso foi cada vez maior. E os números não enganam. Em relação ao The Voice: é um grande formato que teve uma campanha de marketing muito grande. Eu gosto de pensar que tenho uma partezinha de responsabilidade no sucesso da coisa mas não acho "se não fosse eu isto não seria assim". Não penso dessa maneira mas gosto de pensar que dei uma ajudinha.

Quando, durante The Voice Portugal e The Voice Kids, via as audiências e verificava que esses formatos batiam os da SIC [Vale Tudo, O Poder do Amor e Factor X], o que é que sentia?

Tendo em conta que isto é um campeonato e, em vez de pontos, há audiências, obviamente que vamos ver se, àquela hora, ganhámos à concorrência. Toda a gente o faz. Não o vamos negar. E não tem nada que ver com o canal ou com o apresentador. E dava-me gozo saber que fizemos tão bem, batendo o Vale Tudo, o Poder do Amor e o Factor X. Isso deixa-me contente. Mas não tem que ver com "estou a ajudar a RTP!". Tem que ver com o programa que eu estou a fazer estar a ter ótimos números. Isso é maravilhoso.

Apresentar com Catarina Furtado e com Mariana Monteiro: principais diferenças?

Deu-me um gozo descomunal trabalhar com as duas. Com a Catarina já havia uma relação de amizade muito grande desde Feitos ao Bife. E, quando apresentámos os dois, foi muito bom. Eu já disse isto: quando era miúdo, tinha um caderno forrado com fotos de miúdas e uma delas era a Catarina. Pedi-lhe duas coisas. "Não estejas bonita de mais senão ninguém olha para mim. Não ponhas saltos demasiado altos, senão eu pareço demasiado baixo." [risos] Bonita de mais impossível porque aquela miúda é, de facto, extraordinária em termos de beleza. Parece que a idade não passa por ela. E há que dizer que ela sempre teve o cuidado de não estar demasiado alta. A amizade é como na Rádio Comercial: quando uma relação é genuína isso passa para o público. Somos muito amigos e isso notou-se. A parceria com a Catarina é para repetir. E a mesma coisa com a Mariana, obviamente tendo em conta as diferenças. Apesar de ela ser "verdinha" na apresentação, teve uma grande evolução. E também tenho noção de que ela, coitada, fazia um esforço descomunal para ler o teleponto. Ela tem lentes e vê muito mal. De vez em quando, ela dizia: "Eu estou a ver tão mal!" Mas dei-lhe os conselhos que tinha de dar. Ela estudava tanto que eu lhe dizia: "Não tens de estudar tanto, relaxa um bocadinho, diverte-te, que é o mais importante!" No final, ela estava muito mais à vontade. Não digo que as diferenças sejam do dia para a noite, porque não são assim tão diferentes. Mas uma coisa é trabalhar com a Catarina, outra foi trabalhar com uma miúda que estava a começar. Mas eu estou aqui a falar como se tivesse anos disto! E não tenho, longe disso.

Sentiu que, com a Mariana Monteiro, tinha, de alguma forma, e para lhe dar segurança, de liderar?

Não. Eu disse-lhe isso logo de início, que não estava ali para lhe dizer o que fazer ou deixar de fazer. E ela foi-se "deslargando" de correias e foi-se soltando. Eu sempre lhe disse "aqui estamos em pé de igualdade, eu com o meu estilo, tu com o teu, de certeza que isto vai resultar muitíssimo bem". E resultou. Tivemos ótimos números.

"Não houve convite mas houve, obviamente, conversas [com a TVI]"

Já se considera um rosto RTP?

Essa pergunta é armadilhada [pausa]. Obviamente que, tendo em conta os programas que tenho feito para a RTP e que estou há dois anos na estação, é natural que me considerem um rosto RTP e, quando me veem na rua, além da Rádio Comercial, também me falem da RTP. Agora, se eu me considero um rosto RTP? Vou dizer porque é que não me considero: a minha profissão é a rádio. Eu considero-me um rosto/voz Rádio Comercial. É aí que estou sediado. Faço programas de televisão que passam na RTP mas a minha casa, a minha sede, é a Rádio Comercial. Percebo que digam que sou um rosto RTP. Mas se me considero como tal? Não.

Que tipo de ligação contratual tem com a RTP?

Sou colaborador.

Que planos há para esta colaboração, em 2015, além do Sabe ou Não Sabe?

Para já, há Sabe. Já foi falada mais qualquer coisa, mas nada em concreto que possa adiantar-lhe. Desculpe lá Raquel, leitores da Notícias TV, também peço muita desculpa [fala mais próximo do gravador], mas são coisas que ainda estão a pairar.

Considera que o facto de a RTP contratar pessoas fora - neste caso, o Vasco - em vez de usar a prata da casa nos grandes formatos possa causar incómodo?

Essa pergunta não tem de ser feita a mim mas a quem contrata. Quando eu recebo um convite, tenho de responder se sim ou se não. Se há outras pessoas que se sentem incomodadas, não me cabe a mim falar sobre isso.

Nuno Artur Silva é o nome proposto pelo Conselho Geral Independente para administrador do pelouro editorial da RTP. O que acha desta escolha?

Não falando demasiado de um tema que não me diz respeito... posso dizer que lhe mandei uma mensagem e a minha única preocupação quando o fiz foi: "Se vais, vais ter de largar o resto?" Ou seja, Produções Fictícias e Canal Q. Porque eu sei que ele tem um amor profundo, não só pelas Produções Fictícias mas também pelo Canal Q. Ele disse-me que sim que, se for, vai ter de largar. E percebe-se porquê. É um cargo demasiado importante e há questões de conflitos de interesses. Em relação ao que eu acho do Nuno e se é a pessoa certa: para a área de conteúdos, não tenho a mínima dúvida que é a pessoa certa. Tem anos disto, já trabalhou nos mais variados setores e com as mais variadas pessoas. Tem uma rede de connections muito interessante. É uma pessoa que sabe muito de televisão. Trabalha no meio há muitos anos, as Produções Fictícias, antes de haver Canal Q, já trabalhavam para televisão. Ele também fazia o Eixo do Mal para a SIC Notícias. Em relação a conteúdos, e tendo em conta que ele é uma pessoa extremamente idiota - atenção, idiota no sentido de criativo, com muitas ideias - acho que é a pessoa certa.

O que espera de uma RTP com Nuno Artur Silva?

Tendo em conta o passado dele, muito ligado ao humor, gostava que houvesse programas de humor e, já agora, gostava que ele fizesse uma coisa tipo Eixo do Mal na RTP1 ou na RTP Informação, porque acho que ele está maravilhoso nesse programa.

Foi Nuno Artur Silva que o convidou para fazer o programa A Costeleta de Adão, no Canal Q?

A minha aventura no Canal Q começa com A Rede, uma rubrica de coisas na internet. E sou indicado pelo Nuno Markl ao Nuno [Artur Silva]. A partir daí, sempre que fiz coisas no Canal Q, foi com a concordância dele. Portanto, se tive carreira no Canal Q, em grande parte deve-se ao Nuno. Depois, a dada altura, tive uma conversa com ele, quando comecei a fazer o The Voice, disse-lhe "já não dá, já não consigo fazer tudo e mais alguma coisa". Ele percebeu perfeitamente, desejou-me a maior das sortes e foi engraçado porque lhe mandei uma mensagem a dizer: "Com que então cruzamo-nos de novo?" E ele disse: "Vamos lá a ver, vamos lá a ver!" Mas será engraçado cruzarmo-nos de novo, na RTP.

No início de 2014, chegou a falar-se do seu nome para apresentar Rising Star. Houve negociações com a TVI?

Tendo em conta que eu tenho contrato com a Media Capital [empresa detentora da TVI e da Rádio Comercial] e que há uma relação estreita Rádio Comercial-TVI, há sempre um corredor que liga facilmente as duas entidades. Há muito tempo que se fala, devido ao sucesso das Manhãs da Comercial, da possibilidade de a equipa poder fazer coisas na TVI. O Ricardo [Araújo Pereira] fez, o Pedro [Ribeiro] também, o Nuno [Markl] já estava a fazer o 5 para a Meia-Noite e eu já estava a fazer Sabe ou Não Sabe. Não houve convite mas houve, obviamente, conversas. Como há sempre. Mas tendo em conta que eu já estava a fazer o Sabe ou Não Sabe e tinha tudo alinhavado para fazer o The Voice, a conversa não saiu daí. Agora estou ligado por amizade e por projetos à RTP mas sempre que estou com a direção da TVI não há qualquer mal-estar. Pelo contrário. Há sempre um abraço ao Luís Cunha Velho [diretor-geral da TVI] e um beijinho à Rosa Cullell [administradora delegada da Media Capital].

Olhando em retrospetiva, e tendo em conta que Rising Star teve uma edição única e que The Voice teve duas edições, acha que foi pelo caminho certo?

Não vou responder a essa pergunta.

Agora só resta um canal. Foi, em algum momento, abordado pela SIC?

Não, nunca. Aliás, fiz um casting, há anos e anos, para o Curto Circuito, na SIC Radical. E não me quiseram!

Quem foi o escolhido desse casting?

Foi um rapaz chamado Pedro Miranda, numa edição de casting maravilhosa. Divertimo-nos imenso. Os cinco finalistas eram eu, o Frederico Pombares, guionista, que trabalha com o Bruno Nogueira, o Francisco Véstia, que fez há uns anos o Bar da TV, e outro rapaz, cujo nome não me recordo.

"Tinha muita vergonha de falar em público. Hoje, sou um desavergonhado"

Quando era adolescente, em que grupo é que se inseria? Nos betos, nos nerds...?

Beto. Assumo. Betíssimo.

Porquê?

Porque era o meio onde eu estava! Estudei no Liceu Filipa de Lencastre onde grande parte era betinho. Depois, fui para a [Universidade] Católica, betinho continuei. A dada altura, tentei ser um beto radical - não me pergunte o que é isso, porque não faço ideia o que era - mas não há volta a dar. Chamo-me Vasco Maria, c"mon! Não podia ser radical e chamar-me Vasco Maria. Rótulo colado à nascença. Obrigado aos meus pais!

Era o palhacinho da turma?

Não, não. Superdiscreto. Tinha muita vergonha de falar em público. Recordo-me de um episódio: o meu pai [Manuel Peres Newton] era maestro e, uma vez, deram-me um ramo de flores para, no final de um concerto, lhe ir entregar. Dei a um primo meu, foi ele dar. Mas, depois, fui-me soltando. Não me pergunte porquê. Comecei a achar piada a fazer piadas, a falar mais na sala de aula, comecei a gostar de apresentar trabalhos para a turma. Uma coisa leva à outra e essa vergonha foi passando. Hoje, sou um desavergonhado.

O que é que o seu pai acha quando o ouve cantar nas músicas da Rádio Comercial?

Ao início era exigente. Ele dizia "falhaste aquela nota". E eu dizia "ó pai, não é pela minha voz que as pessoas ouvem isto, é mais pela letra". Também me lembro de uma, em que fiz uma versão do Bonga para o Relvas. E dançava. Deu-me para dançar! O meu pai viu o vídeo e disse: "Vasco, não é assim que se dança." E eu: "Pai, também não é pela dança que as pessoas veem isto." [risos] O meu pai já foi mais crítico e mais exigente. Hoje até dá ideias.

O seu pai é natural de Moçambique. Já lá foi?

Com ele, não. Já lá fui uma vez. Perguntei-lhe se ele queria ir, e ele disse que não.

Porquê?

Não sei. Coisas dele. Ele saiu de lá muito novo, com 18 anos, para fazer aquilo que queria. Tenho o maior respeito e o maior orgulho dele. Um puto de Moçambique que, em criança, diz que quer maestro e sai da sua casa para ir à aventura, vem para Portugal, consegue uma bolsa de estudo, estuda na Áustria, em França, com bolsas de estudo locais, e depois com uma bolsa de estudo atribuída pela Gulbenkian... sem ninguém. E, depois, chega cá e consegue a vida que tem... tenho o maior orgulho naquilo que conseguiu.

Tendo em conta o percurso do seu pai e o seu crescimento... quando é que começou a ter noção de que teve uma infância privilegiada?

Eu tive noção disso muito cedo, especialmente quando passei do colégio para a escola pública. Foi decisão dos meus pais - especialmente do meu pai - que, quando cheguei à quarta classe disse: "Já chega, agora tens de saber o que é a vida." A infância privilegiada que eu tive foi, depois, poder ter a noção das coisas. Eu achava, quando estava no colégio, que aquilo é que era normal, e que as festas de anos em casas enormes com jardim era o normal, e que ver grandes carros a ir buscar os meus colegas era o normal... mas depois fui para a escola pública e tinha amigos cujo quarto era a sala. Ia a festas de anos em que as casas eram minúsculas. Isso foi o que mais me ensinou. Ou ter amigos meus que queriam ir para minha casa para estudar porque eu, no 5º ano, estava a dar coisas que já tinha estudado na 4ª classe. O privilégio que eu tive foi ter a noção de que poderia ajudar alguns amigos meus. Foi bom para mim.

O Vasco é filho único. Durante a infância, brincava com amigos na rua?

Joguei ténis durante muito tempo, por isso o tempo que tinha fora das aulas era a dar-lhe forte e feio e a treinar ténis. O meu círculo de amigos sempre foi o do ténis, daí vem, por exemplo, a minha amizade com o Tiago Bettencourt, que dura até hoje.

Chegou a competir?

Cheguei, cheguei! Quando era sub-16 fui número 14 a nível nacional.

Porque é que não continuou?

Porque cheguei à faculdade, tinha de estudar e tive de optar. Ou era a sério no ténis ou era a sério nos estudos.

Continua a jogar?

Ténis já não. Agora jogo paddel. E, sinal dos tempos, estou a envelhecer, jogo golfe!

Como é que começou?

De dois em dois anos, há uma coisa chamada Ryder Cup, uma competição que coloca frente a frente EUA contra a Europa. Comecei a ver aquilo, a empolgar-me... e como é que eu comecei a gostar da coisa? Porque os senhores da SportTV, que estavam a transmitir aquilo em direto, diziam "se está a ver isto e tiver dúvidas, mande-nos um e-mail". Mandei um e-mail e, passados cinco minutos: "Bem, recebemos aqui um e-mail do Vasco Palmeirim..." E eu, que faço televisão, fiquei "estão a falar de mim, estão a falar de mim na SportTV! [risos]!" Tenho um colega na rádio, o João Pedro Sousa, com quem fui experimentar golfe, no Jamor. E pronto, ando a ter aulas e excitadíssimo com golfe, um desporto que, há uns anos, era boooooring!

O que tem achado do percurso do Sporting nesta época?

Estou muito contente. Continuamos em quatro frentes, com um treinador que eu adoro. Já quando ele estava no Estoril, no primeiro ano, escrevi no Record "atenção a este senhor chamado Marco Silva". Fiquei muito contente por o Benfica não o ter ido buscar e por nós o termos ido buscar. E, já agora, fiquei muito contente por aquele clima muito estranho que, há umas semanas, estava em Alvalade, se ter resolvido.

O que achou da postura de Bruno de Carvalho no quid pro quo com Marco Silva?

Não me meto em assuntos que não me dizem respeito até porque não sei a história toda. Acho que nem eles próprios sabem. Achei estranhíssima a entrada daquela personagem, o José Eduardo, no meio da história. Primeiro diz uma coisa, que o Marco Silva não é um anjo, é um diabo e que tem de sair do Sporting porque está a minar aquilo tudo. E, depois, passados uns tempos, diz "eu nunca quis que o Marco Silva saísse". Ninguém compreende o homem, acho que ele próprio, a dada altura, já não sabe o que há de dizer. Eu quero é saber do meu Sporting, quero que o Bruno de Carvalho continue a fazer o bom trabalho que tem feito. Só me posso dar por feliz por essa história ter terminado.

Na passagem do ano, o desejo de uma das passas foi tirar a carta?

Eu não como passas, como uvas mas, neste ano, nem isso houve. Eu já desisti porque estive a fazer contas, é horrível. Eu vou fazer 36 anos. Tendo em conta que eu posso tirar a carta a partir dos 18, já há metade da minha vida que eu podia ter a carta. E não tenho! É muito! Eu continuo a dizer a mim mesmo "este ano é que é!". É a frase de um sportinguista! Já acreditei mais que vai acontecer mas, quando acontecer, vai ser uma coisa muito pouco publicitada. Vou fazê-lo sem pressão.

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